Por Autor desconhecido
20/11/2020 · Desenvolvimento pessoal
Otávio, o caixa, por certo nunca ligara para problemas de comunicação. Falava... e dizia. Pronto. O interlocutor que ouvisse... e escutasse.
Ignorava, talvez, que a cada universo de ouvintes corresponde linguajar específico, um repertório. Palavras como “isótopo” e “fissão” só costumavam ser inteligíveis entre os iniciados em física nuclear.
Expressão como “Malagueta diz que vai apagar o macaco” pode ser corriqueira entre os policiais e malandros, mas para outros mortais carece de tradução (Malagueta diz que vai matar o policial).
Otávio não atentava para isso. E se julgava, sem dúvida, possuidor de comunicação universal, acessível a qualquer repertório. Falava e dizia. Quem ouvisse, que escutasse.
Assim, quando Terezinha lhe apresentou o cheque, ele nem imaginou que a cliente talvez não entendesse o idioma bancário.
Falou: Por favor, moça, seu cheque é nominal a Terezinha Gomide. Precisa de endosso.
Terezinha escutou, mas não ouviu. Nominal? Endosso? Endosso tinha sabor de açúcar. Mas não, não era possível, não tinha nada a ver.
Desculpe, seu Otávio. Não entendi.
De novo o caixa falou. E disse: simples, coloque sua firma aqui no verso.
Ainda sem ouvir, a cliente espichou-lhe o olhar interrogante. Verso? Firma? Que diabos. Antes “nominal”. Agora “verso” e também “firma”. Ora, eu não sou sócia de nada! Nem poeta!
Terezinha, atônita, achou de “desperguntar”: Perdão, seu Otávio. Continuo não compreendendo.
Deu-se, por fim, o estalo. O caixa sentiu os cifrões da própria língua, pensou no repertório de Terezinha e tratou de adivinhá-lo.
Fácil, pensou! Com sorriso de “psicologice”, foi virando o cheque.
E apontou, feito cúmplice:
Coloque aqui seu nome. Assim, como você faz no final da carta pro seu namorado.
Terezinha iluminou-se. Decidida, pegou firme na caneta e lascou no verso do cheque: “Com todo amor, um grande beijo. Terezinha”.
Diante daquela Terezinha sorridente, Otávio, o caixa, foi apresentado à Dona Comunicação.
Sentiu, naqueles olhos brilhantes, que há repertórios e repertórios. E que falar nem sempre é dizer.
(autor desconhecido)